terça-feira, 9 de abril de 2019

AVISO

Genty, venho avisar que este blog vai ser desativado em breve, estou buscando uma outra plataforma digital para publicar meus textos, e, também atualizar estes escritos que aqui postei e já se encontram em outro formato. Fiquei muito tempo sem postar por aqui, na real sem pôr ao Sol várias coisas que tô escrevendo, mas esse ano eu tô de volta.  E assim que eu tiver o rodejã pronto, eu posto aqui o novo link, e boto nos rode tudo o novo link da plataforma.  Cheiro no Edi de vocês.

Jorge Maravilha
(@jorgemaravilhaa)
Maria é culpade!

I.
e agora minha boca já começa a salivar
T as angustias com tamanho desespero
lá vem a onda de lágrimas brotando no contorno sutil
dos olhos
lá vem o soco no estômago
a respiração ofegante
o coração apitando
alertando
é crise
é queda
respiração afobada
lembre-se:
não consigo me recordar
luta por oxigênio
arduo
me esfaqueio
em frente ao espelho
pego os cacos de vidro
e raspo em minha pele
o sangue jorra
pinga
e eu grito
busco o ar em meio a tanta água
as conexões neurais já não são feitas
raspo a pele
vejo meu eu verdadeiro
tão doido
o ar machuca na pele
recém marcada
já que este reflexo
está tão podre
tão diminuído
tão merda
tão fingido de dor
tão ridículo
não é, meu amor?

Maria jogava suas coisas no chão, gritava, seu rosto já machucado de tantas facas empunhadas, raspava a pele com a faca amolada, tentava tirar de seu corpo a podridão que o seu Amor tanto falava sentir, só dela chegar, só dela existir e ter a história de alguém que morava em um lugar privilegiado, afinal ela só seria preta o suficiente para Ele, que era preto também, se tivesse uma estrada de muita pobreza, como a que Ele tinha, ela ainda tinha, pra completar o ciclo que Ele nomeava privilégio, um pai militar com 32 anos de carreira, e uma mãe dona de casa e esposa de Cristo, seus criadores, como ele dizia, todos fediam, agora seus pulsos já em sangue, Maria fritava tanto seu cérebro que a baba escorria de seu nariz, de sua boca, chutava, socava o chão frio do quarto a fim de sentir qualquer coisa que fosse; jogada no chão, balbuciava  em torno da mesma sentença: eu sou um monstro, eu sou uma porca, eu deveria morrer. Uma sentença dita todas as vezes que a acusavam de estar errada, de estar fora da normalidade e Maria estava, na real, sempre esteve. Maria era uma agressora, diagnosticada com bipolaridade e diversas ideações suicidas, Maria era do tipo ciumenta, daquelas que tenta segurar o amor com punhos de ferro, na menor ameaça de sua retirada, Maria partia para cima, agredia, batia, enfiava a cabeça de quem ela mais a amava na lixeira, só por se sentir trocada por algo novo, rosinha, branco, um ódio lhe ardia, um ódio de se tirar roupas na rua, totalmente entorpecida, inúmeros tapas de relatos, e daqui só saíra o primeiro, você decide depois se continua a ler os demais, afinal ela era só um carrasco amoroso, alguém que estava muito fudida com todas as histórias quebradas que trazia dentro de seu corpo-túmulo, todas terminando com Maria repetindo para si mesma a mesmíssima sentença: eu sou um monstro, eu sou uma porca, eu deveria morrer.
            Maria acatava a todas as sentenças de seu Amor, afinal, Maria nunca tinha tido um amor, não um amor que estivesse presente, 24 horas de seu dia, era empolgante, era feliz, era realizador, as palavras não conseguem transpor essa magia, talvez por que não exista? Enfim, um Amor que lhe dizia querer ter mais horas para dividi-las com ela, aqueles clichês ‘somente com ela tinha se sentido bem, amado’, todas essas mentiras que o amor nos conta para nos ter como servo, mas Maria tinha a visão de um amor de televisão. Maria não sabia que o amor não existia, e que o amor em vidas negras exige como moeda de troca a sanidade, Maria se entorpeceu desse amor dependente, carente, agressor, e suicida, principalmente suicida. Nunca tinha lidado com a morte tão de perto, e de forma tão eminente como nesta relação, eu acho que o nome disto era relação. Seu amor era suicida, e já lhe alertava desde do princípio, que um dos seus maiores desejos desde que se conhecera por gente era se jogar de algum lugar bem alto e com tanta força que sua cabeça se espatifaria no chão, e a realidade não mais se faria encarnada em sua vida. Maria não sabia como lidar com esse desejo de morrer que feria tanto quem ela tanto amava, Maria só sabia dar a mão a seu amor suicida, quando este olhava para o chão do parapeito, exatamente do segundo andar da Rodoviária do Plano Piloto, Maria só sabia pegar em sua mão, e olhá-lo, e olhá-lo por muitos tempos. Maria nunca tinha lidado com a morte tão de perto, tinha sido cristã não fazia tanto tempo, tinha estado em um relacionamento com um menino-branco-rico-do-Lago-Sul, que a tratava como boneca inflável, e boneca inflável Maria foi, por uns três anos, porque acreditava que o amor era aquela mesmice e aquela mecanicidade engessada, aquele bate-penetra com hora marcada, viveu três anos em cárcere privado, em cárcere no quarto do menino-branco-rico-do-Lago-Sul que queria uma negrinha para viver umas aventuras, e perder a virgindade, e Maria sempre foi muito devota ao amor, se rasgou para este e aquele, mas terminou, e este novo amor que lhe aparecia, lhe trouxe ares de revolução lhe falava sobre poligamia, liberdade, risos, toques verdadeiros, mas principalmente lhe falava de confiança, olhava em seu olho mas Maria ainda trazia como preocupação os traumas do antigo amor branco, tinha sido estuprada diversas vezes, um estupro velado por vez, inclusive Aquele  dia ainda se mantém palpável em sua mente, lembra-se de André estar em cima dela, e ela estar sentindo muita dor, como sempre, já se tornara rotineiro as dores que sentira com a penetração, já que seu corpo lhe respondia que estava traumatizado, assim nem mesmo um filete de ar passava, não tinha condições de um pau se aconchegar ali contudo, isso não agradava seu companheiro, assim Maria engolia a dor, o rio de choro a seco e dava e dava e dava e dava e dava e dava sem parar muitas vezes, ou poucas vezes dependendo de como o Chefe queria, nesse dia, Maria lhe disse: para, por favor, tá doendo muito! E Ele.. Ele só continuou, consigo lembrar das batidas da cama na parede, e eu tentando não gritar de dor, depois Maria disse para ele: por que você não parou? Eu disse que estava doendo. Ele a respondeu com O silêncio que a partir Daquele dia se fez Império por todo o sempre, aquele dia nunca mais foi falado ou rememorado, a não ser hoje, agora que relato ele para você, que não deve nem lembrar mais do que a história se trata, mas, enfim. Fora todas as outras vezes que ele comprava bebidas, vinhos, porque percebeu um padrão: Maria só lhe dava o buraco se estivesse alcoolizada. Maria quando percebeu isso, só conseguia jogar com as indiretas dizendo: estes homens que dão bebida para as mulheres, pra comer elas, é estupro igual. Lembro-me Dele dizer: mas e se ela gosta? Não soube o que responder. São inúmeros tapas, e são tapas e mais tapas de relatos. Maria já teve até porra colocada à força na sua boca, em meios às falsas desculpas seu amor-parceiro dizia que não conseguia evitar, estava muito gostoso, e a boca de MarIa não se comparava a de nenhuma outra que ele já teria metido. E um elogio desses, Maria não sabia como reagir, seus filmes não diziam, já não podia viver mais sem o amor, afinal o amor era isso mesmo, umas horas doce, outras amargas, ela se convenceu. Dando às vezes até sem parar tal como uma boneca inflável, nada mais penetrava Maria, não sem sentir que em seu buraco tinhas farpas, cada tentativa parecia que ficava cada vez mais e mais seca, nada a fazia abrir, Maria trazia essa preocupação quando estava com seu novo negro amor, que ele achasse que o problema fosse ele, e ela não queria ter que contar pra ele, ou melhor confessar, a cilada que tinha se metido daquele antigo amor branco, do menino-branco-rico-do-Lago-Sul, não pra esse novo amor que era tão revolucionário, negro, divertido, verdadeiro e iria diminuí-la. Ela já sentia no tom de voz. No fundo Maria sabia que aquele novo amor não aceitaria. E não aceitou um não como resposta, não com poucas argumentações, então era melhor somente ocultar alguns fados.

Depois eu continuo essa história.... 

quarta-feira, 14 de novembro de 2018


Maria é culpade!

II.
as paredes de um pedaço da vida
me disseram:
sorria pequene
tu é tão linde
tu é t ã o linde
e eu juro que
quase
quase acreditei
mas era parede.

                Maria dormia fazia mais de um mês nos corredores brancos da Universidade de Brasília, numa tentativa infantil de pôr combustível em suas próprias militâncias, antes de iniciar a história, me apresentarei conforme manda o molde, já que hoje em dia a gente é categoria. Essa história, esse relato, é um relato de uma mulher negra moradora do Plano Piloto, vinda do Rio de Janeiro, especificamente da Zona Oeste do Rio de Janeiro, vinda de uma família negra, pobre, e bastante empenhada em viver um dia de cada vez, uma família cheia de brigas, contradições... Eu sugiro que os pretos que não consideram esta categoria, esta história como parte do relato de genocídio negro, porque somos privilegiados do Plano Piloto, e toda essa história de ninar maravilhosa, que pra você tem pouca pobreza demais, pra ser um relato preto, porque o estereótipo de sermos sempre fudidos para nos enxergamos enquanto pretos dignos de fala, foi vendido e está sendo vendido em cada canal de televisão, inclusive que passa na sua TV de plasma gigantesca, TV que tinha na casa de Maria, protagonista da história, e TV essa que todos dessa classe média possuem, e este esteriótipo da pobreza está impregnado até o talo e se faz como base nos processos de embranquecimento desse mesmos pretos privilegiados do plano piloto, parte estruturante, eu diria, deste processo, processo não, assassinato né, suicídio pra nós. Enfim.
            Este processo embranquecedor próprio de uma galera preta classe média, e lógico, claro, evidentemente, e blá-blá-blá, que eu não digo isso, de to-das as pessoas negras, eu digo, e falo de você, preto militante da classe média, que é hipócrita e diz que é da periferia porque acha que do seu lugar de fala, não se tem fala negra, nem problemática negra, e esta hipocrisia não se deve  por falta de informação, mas por parte de um processo colonizador branco bem certeiro, que te fazer crer que você, pelo lugar que ocupa, não é negro, e esse comportamento de IBGE também se reverbera nas pessoas negras, que buscam categorizar quem é mais negro ou quem é menos negro dependendo da quantidade de cédulas no bolso. Muito do pardismo tem a ver com o pacto que essa mesma classe média faz em apagar seu passado negro, sua história negra, sua ancestralidade negra, e isso tem gerado um passo em direção contrária a nossa tão sonhada União Preta. Lombra, né? Santa ingenuidade a nossa, a sua, e daqueles, (que Nunca nós, eu-e-você né, Nunca, mas tá), aqueles que estereotipam mais a nossa realidade. Se a gente não começar a debater, e debater sério sobre essa classe média negra, que é hipócrita, que é servidora pública, que é militar de carreira, que inclusive, está presente neste eterno êxodo diaspório dentro do país, desta população negra, como no caso que se dá aqui em Brasília com famílias negras que se mudam do Sudeste pra Brasília, por transferência militar, que vem de lugares periféricos mas que aceitam em troca de uma amnésia com lucros, ou melhor uma senzala com ar-condicionado esquecer sua própria história, e isso é parte da realidade de muitas famílias negras que moram na Asa Sul, por exemplo, que é a realidade que vou falar neste conto, porque muito da nossa desunião, vem dessa hipócrita classe média preta com seus pardismos, isto é com seus acordos brancos. Dizem que lá no passado, e ouvi isso de um Babalorixá, que os africanos não confiavam nos negros brasileiros para compartilhar  os segredos de seus cultos religiosos, por medo de que estes negros brasileiros entregassem seus segredos aos brancos, receio do acordo, do tal acordo destes negros brasileiros, nós, e agora nós dessa classe média preta que herda esse comportamento de pardo, de estar lá e cá, que se ludibria com a promoção de bobo da corte do mês, ou até entrega todo um povo por um caso de amor branco. Enfim.
            Maria buscava o movimento negro universitário por sede de revolução, real oficial, de algo que poderia fazer pela sua gente no lugar que ocupava, foi em algumas reuniões, com seu amor-suicida da época, que já era tapas e milhões de tapas de relatos, infelizmente ou felizmente Maria tá viva, ou natimorta, já que sou e não ela que escreve essa história. Maria foi parar dentro de um movimento, dito negro, de uma dita Universidade, com B maiúsculo, de acordo com os chiquérrimos parâmetros CAPES que nos aponta que a UnB tá acima da média. Engraçado! Quem estuda ou frequenta ou orbita de alguma forma neste lugar, sabe que pra baixo da média é o mínimo de eufemismo que se dá pra UnB. É tanta negligência que se a gente for esparrar, e eu vou eventualmente, a sujeira, o passa pano como Lei Central, Eixo Horizontal da UnB, digamos, talvez, pensando por aí, possamos entender o porquê do número de suicídios aumentarem ano após ano nesta universidade, saúde mental precarizada, e negligenciada pela própria universidade e seus chupa 17, inclusive esta sempre se mantém no silêncio dos covardes, bem próprio também do movimento de esquerda branca universitário, que é um retrato bem fiel da galera branca, também de esquerda, só que com doutorados que compõem a reitoria, essa universidade negligencia com pessoas pretas periféricas e não periféricas, os da periféria sumindo, também em surto,e os que são do plano tão em surto ou beirando a um, ou tão fazendo seus pactos com os brancos ditos amigos de suas escolas particulares custeadas a base de remédio anti-depressivo, e se clareando, é claro, pra ser aceito na grande seita pardista. A UnB continua a negligenciar com aqueles que gritavam e, com aqueles que ainda gritam por ajuda, e isso se mantém ano após ano,  afinal a universidade tem sempre a lei de: ou a gente deixa o estudante negro vagando pelos corredores, aí vai dá responsabilidade dele de procurar um atendimento, ou a gente interfere com uma segurança de iluminação de postes e diz tá fechado com o palanque da Diversidade, diz que tá pro debate, isto já nos mostra a cara que faz essa esquerda, bem branca, bem limpinha, com seus sustentáculos pardos. Quem tá vivo, e é preto na Universidade de Brasília, sabe muito bem, a pressão constante pra lidar com a hipocrisia e branquidade do espaço. Enfim. Maria.
             Maria por ali orbitou por uns tempos, essa universidade tinha o dom de retirar todas as suas forças, a um ponto de perder sua própria sanidade, sobriedade, ás vezes regada a muita droga, outras vezes só de estar ambientada ali, com os que já se foram ou que tavam quase indo, com os que tavam perdidos de outros caminhos e ali se assentavam, outros que dali se saíssem seriam internados no HPAP, realidade desta universidade, de lá, só de estar, Maria já se tornava embadagada por esta vida, energia beirando a zero, crises de ansiedade costuradas a pânico elevados, Maria sempre teve uma coroa muito iluminada, o povo que nos ronda por ajuda rapidamente encontravam ou davam um jeito de encontrar Maria pra irem embora, buscavam Maria, não só Maria como sua amiga Brasil, e diversas outras que por ali orbitavam fazia meses, e outras que agora estão.
            Maria vagava e vagava e vagava pela universidade, ás vezes andava tanto que parecia estar atrás de algum lugar, de alguém, ás vezes andava muito rápido, parecia fugida, mas fugia andando em círculos, difícil né? Seu coração disparava, mas era nada, não no plano real. A sensação que nos dá na UnB, é a de estarmos pagando por alguma vida que ali ficou, preta no caso de Maria.
            Muitas vezes, Maria acordava ia com sua amiga Brasil no Lago que tinha no final do Centro Olímpico, catavam as bia, fumavam, sonhavam com o privilégio de comerem bem, saírem daquela energia, daquela universidade e quem sabe serem felizes, e retornarem pra família com alguma coisa, Maria pôde conhecer outras ruas que orbitam para dentro desta Universidade, e são inúmeras, e inúmeros os caminhos.
            Rege a lenda branca que a Universidade de Brasília tem diversos corpos de estudantes  embaixo de sua terra, eu digo lenda porque os próprios estudantes brancos de hoje que lá estudam, não vingam a sua própria história oficial, da tão famosa ditadura civil militar, essa mesma gente branca não busca defender, nem cuidar de seus antepassados que na terra da UnB morreram, aqueles poucos que entre eles  foram mortos, por estarem lutando por aqueles que já morriam aos montes, fora desse espaço bolha elitista, e que realmente eram e são o alvo, inclusive karin sant'anna kossling tem uma dissertação, tapa de relato sobre a perseguição do antigo DOPS para com os estudantes negros do Rio de Janeiro, e intelectuais negros, estudiosos negros, nós em em geral.  ,
            O dono desta terra universitária, talvez, e digo talvez, não goste muito do nosso esquecimento perante o massacre que se deu aqui. Diversas pessoas não conseguem, muitas vezes, lidar com a energia dos mortos, que na UnB habitam, é a negligência branca, que negligencia, e digo isso porque se branco tem ancestralidade, então eles deveriam cuidar da Morte, dos seus antepassados ainda mais os que morreram injustamente, como disse um babá, que inclusive passou pela UnB: devíamos cuidar da Morte, pois ela como a Vida compõe o homem, o mundo que vivemos. Mas, branco não entende de dever, e resta pros pretos do espaço sentir a tamanha energia, e guerra que ali tem, a responsabilidade.
Veja.
            Maria por um tempo, começou a ficar muito louca pelos corredores, acendia pela madrugada diversas velas, no subsolo do ICC, colocava algumas carnes que cheiravam bem, aceboladas, nas árvores, farofas em outros lugares, e todos os brancos que a olhavam a consideravam louca, uma que já não tava mais nessa realidade. São inúmeras negligencias, mas eu continuo esta história depois. Se eu sentir que vocês tão realmente prestando atenção no que tá sendo relatado. E entendendo.

terça-feira, 25 de setembro de 2018

Enlamade nesse gozo
que deixastes no meu corpo
nessa esquina exposta me ponho a trabalhar

sinto o sangue jorrar
e, na epiderme da carne, os roxos a aflorar:
tudo fruto desse teu bate penetra sempre a me violar

Não preciso
e Nem movo um único músculo de meu corpo
meus olhos captam os vultos que passam a assoviar

Já recebi inúmeros
Tapas, socos,
puxões, palavrões
pra esse abate se fincar

Inúmeros
Tapas, socões,
puxões, palavrões
pra esse abate se corporizar 

olho o ponteiro do relógio
penso: mais 5 minutos... e ele goza!

Escorre, enfim, teu prazer algoz colonial    

Lágrimas se iluminam em minha face
e o silêncio se faz Império patrimonial


domingo, 18 de fevereiro de 2018

Minha boca saliva a baba
Fruto desse ar apimentado
dessa orquestra a la Casa Grande
Desse sinhozinho Temer

Seus sustentáculos: Ordem e Progresso
Uma reescrita de Heinrich Himmler a la Walter Braga Netto
estampado de verde e amarelo o tumbeiro Exército a la SS
Financia as covas destinadas pros pretos favelados
Fechando com Pézão e convidados: o chão sedimentado pro triunfo sobre o extermínio em massa

No enterro dos rejeitados
a classe burguesa se afoga em consumo promocional
Gozam isteries
Com cada preto custando 4, 00 a hora pra serviço terceirizado a la escravatura

Essa pátria carrasca mimosa dos sonhos brancos de sinhozinho Temer
nos revira no estômago memórias de um tempo outro-este
O medo pousa em nosso peito que levanta nossa ginga
Que nos dá a força pra meia-lua
Que nos faz erguer
Que acelera e se desfaz como novelo
nas ondas que quebram e nascem nos seios de Yemanjá

Odoyá Yemanjá!
Banha de leite materno nossas entranhas
abraça forte o nosso peito negro
Ouço o riso do Dono de escravo, de outrora, na beira do precipício de minhas memórias

Mamãe Yemanjá!
Mela de sal minhas memórias: faz arder minhas feridas
Nos refugia, Yemanjá, em teu peito que como concha
guarda a nossa esperança: Nossa pérola negra encharcada de sangue e suor.

Tenhamos força, camará!


Joyce Viana


domingo, 21 de maio de 2017

“Pastoral scene of the gallant south,
The bulging eyes and the twisted mouth,
Scent of magnolias, sweet and fresh,
Then the sudden smell of burning flesh.

Here is fruit for the crows to pluck,
For the rain to gather, for the wind to suck,
For the sun to rot, for the trees to drop,
Here is a strange and bitter crop.”

Strange Fruit de Billie Holliday 



encaro 
o chão sob minha janela 
questionamentos 
fervilham 
que valor 
tem a vida? 
poderemos 
respirar 
sem o rasgo 
da chibata 
em nossas 
costas pretas? 
estamos, malungos,
ensopados 
de sangue 
estamos a rolar 
condenados 
eternamente 
a esta servidão 
labutados? 

só na morte 
o descanso 
se fará? 
mãos calejadas 
de terras 
e enxadas 
somos carnes 
promocionais 
em teus açougues 
estampa 
em tuas butiques 
pensas que eu não sei..
em teus olhos coloniais 
K.K.K 
antigos presenciais 
não passo 
de carne preta 
a ser abatida 
na sua sala de 
bem-estar? 
um objeto exótico 
a ser empalado 
em tu parede 
um troféu 
de notória caça

te servindo 
me relegaram
para exclusiva 
função doméstica 
supervisionada 
por 400 reais 
na abolição 

questiono 
me enforco 
em tua banheira 
ou espero 
quando vamos 
estar 
livres 
final 
mente 
para sonhar 
e amar 
plena 
mente 
meus caros 
malungos. 

domingo, 12 de fevereiro de 2017

Querubim

te entrelaço em morte querubim
meus gritos te ensurdecem
surdo já não escutas
as bombas que soam lá fora

as bombas querubim

elas tem matado tanta gente
tanta alma em gente
segundos inalienáveis
não me largam
não me saltam

te entrelaço em morte querubim
gritos te ensurdecem

te devoro em partilhas
voa, foge, corre
a morte se aproxima
querubim
os portões estão se abrindo
o camburão vem chegando
malungos a gritar
os portões estão se abrindo

e eis que a verdade
se acovarda
- sou morte em vida
sou nada: puro esvaziar
submerso em
profundo azul

ar?
cadê?
não encontro a pomba
querubim?

cena de guerra
pólvoras aos céus

(fecha-se os olhos)
eis que a morte me subverteu
me subverteu
querubim.